terça-feira, 29 de setembro de 2009

Viburnum lantana (Adoxaceae), um arbusto novo para a flora indígena de Portugal

Há 2 meses atrás recebi um e-mail de um estudante de medicina, nado e criado no concelho de Vinhais (distrito de Bragança), com um enorme gosto pela botânica e pelo património natural da sua região. Com três fotos, meia dúzia de linhas bem informadas e dois excelentes exemplares de herbário, o Victor Alves provava que tinha encontrado uma nova planta com flor, autóctone de Portugal - o Viburnum lantana. Uma nota florística a anunciar esta descoberta será, até ao final do ano, publicada numa revista da especialidade.



Habitat de Viburnum lantana em Portugal: margens de linhas de água permanentes, na vizinhança de bosques edafoxerófilos de Quercus rotundifolia «azinheira» [fotos amavelmente cedidas por Victor Alves]

Viburnum lantana (Adoxaceae) [fotos amavelmente cedidas por Victor Alves]

O Viburnum lantana vem engrossar uma já vasta lista de espécies cujo limite sul de distribuição no NW peninsular, ocorre no Parque Natural de Montesinho (PNM) ou na Serra de Nogueira. A peculiaridade florística do PNM e da Serra de Nogueira levou o Prof. João do Amaral Franco a criar uma unidade biogeográfica autónoma, apelidada de "Nordeste Leonês", na sua zonagem fitogeográfica de Portugal (vd. J. do A. Franco, Nova Flora de Portugal, vol II, 1984).
Para além da importância da descoberta em si, este belíssimo arbusto é uma testemunha do papel fundamental que os amadores de botânica podem, e devem, desempenhar na exploração da flora de Portugal.

sábado, 26 de setembro de 2009

Sapal externo I


Sapal externo no Estuário do Rio Sado. N.b. a baixa mar deixou a descoberto lamaçais desprovidos de vegetação vascular, e plataformas de sedimentos colonizadas por comunidades de sapal externo, dominadas por gramíneas ou amarantáceas [foto C. Aguiar]

Os sapais são ecossistemas semiterrestres (= anfíbios). Prosperam em zonas costeiras protegidas da agitação marítima, i.e. de baixa energia. Os sistemas de ilhas barreira (e.g. Ria Formosa), os sistemas lagunares (e.g. Vouga) e os estuários (e.g. Minho, Lima, Mondego, Tejo, Sado e Mira) são particularmente adequados à diferenciação de sapais.
A génese, dinâmica e alguns aspectos da ecologia do sapais estão diponíveis, por exemplo, aqui. Neste post explorei as diferenças entre sapal externo e sapal interno. Falta agora resolver os chamados sapal externo baixo, médio e alto.

O sapal externo é banhado por águas de origem sobretudo marítima, necessariamente com um elevado teor em sal. Por se situar na faixa intermareal, o sapal externo está, ao sabor das marés, sujeito a um ciclo bidiário de emersão-submersão. Na preia-mar inunda-se de água; na baixa-mar a água abandona o sapal externo através de uma intricada rede de canais.


Sapal externo e lamaçais no estuário do Tejo durante a baixa-mar. N.b. rede de drenagem [foto C. Aguiar, tirada durante uma viagem na carreira aérea Bragança-Lisboa]

A duração da submersão da vegetação de sapal depende de pequenas variações na altitude dos sedimentos, relativamente ao nível médio do mar. O sapal externo baixo situa-se a cotas muito próximas do nível médio do mar, consequentemente, está submetido a períodos de submersão muito prolongados. O sapal baixo contacta com lamaçais (colonizados ou não por plantas vasculares aquáticas marinhas) e com o sapal médio. O sapal médio está intercalado entre o sapal baixo e o sapal alto. Acima do sapal médio situa-se o sapal externo alto, uma estreita faixa de vegetação halófila fugazmente, ou raramente, atingida pela água das marés. Estes três tipos de sapal externo organizam-se, portanto, em bandas perpendiculares ao sentido da variação do gradiente "duração da submersão", a cotas progressivamente mais elevadas, nas plataformas de sedimentos de sapal (tema para um post um destes dias).

Geralmente, assume-se que as plantas de sapal externo, e implicitamente as suas socializações (comunidades), se organizam espacialmente ao longo do já referido gradiente microtopográfico, em função da sua tolerância à anoxia radicular (falta de oxigénio ao nível das raizes). Bem, não é assim tão simples. À medida que a cota aumenta, as raízes das plantas estão, de facto, sujeitas a menores períodos de anoxia , mas também a maiores oscilações da temperatura e do teor em sal do solo. A química do solo varia também acentuadamente na mesma direcção, mas este é um tema fracamente especializado.

Nos sapais mediterrânicos o teor em sal aumenta acentuadamente em direcção ao sapal alto. O mecanismo é simples. A água do solo evapora-se, por capilaridade mais água salgada atinge a superfície do solo evaporando-se em seguida; o sal que fica para trás concentra-se próximo da superfície do solo. No sapal de Castro Marim chegam a formar-se crosta de sal “salt pans”. As chuvas, por seu turno, provocam descidas bruscas na concentração de sal, rapidamente repostas por capilaridade.
Nos sapais atlânticos (de clima temperado) a acumulação de sais no sapal alto é relativamente lenta (porque faz menos calor e a insolação é menor do que nos sapais mediterrânicos) e as chuvas mais frequentes. As comunidades de sapal alto atlânticas estão, por isso, sujeitas a menores concentrações e a variações temporais menos intensas da concentração de sal no solo do que os sapais mediterrânicos. Como a mediterraneidade climática em Portugal continental aumenta de norte de para sul, existe um forte gradiente latitudinal nas características do solo do sapal alto e, consequentemente, na sua flora. Este gradiente latitudinal é menos nítido (o "turnover" latitudinal de espécies é menor) nos sapais baixo e médio, porque a intensidade da anoxia radicular é, provavelmente, o factor dominante na estruturação das comunidades de sapal baixo e médio.

Para quem gosta de botânica: a flora do sapal alto mediterrânico é maravilhosa; marcar quanto antes uma visita aos estuários a sul do Rio Mondego!

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Suaeda albescens (Amaranthaceae)

Três fotos de uma outra amarantácea anual que tem por habitat, à semelhança da Salicornia ramosissima (clicar aqui), as clareiras de sapal externo baixo e médio.

Suaeda albescens (Amaranthaceae) [Ria Formosa, Algarve; fotos amavelmente cedidas por Valter Jacinto]

A Suaeda albescens é um endemismo ibérico morfologicamente próximo da S. maritima - espécie com a qual se confundiu até há bem pouco tempo (vd. Flora Iberica aqui) - cuja distribuição se estende deste Gibraltar até ao País Vasco, atravessando de forma irregular os sapais nacionais.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Orgulho nacional australiano colado com goma arábica

Racosperma mearnsii (De Wildeman) Pedley (foto: C. Aguiar)

Soube de uma séria polémica internacional envolvendo a nomenclatura científica das acácias através de colegas mais envolvidos na Botânica tropical e que julgo não se importarem que divulgue esta estória. O Carlos também me incitou a escrever esta nota sobre o assunto.

Vejamos. Existe evidência taxonómica de o género Acacia Mill. ser, afinal, constituído por cinco entidades genéricas distintas, cada uma delas merecendo a categoria de género autónomo. Nestes casos, o Código Internacional de Nomenclatura Botânica (CINB) prevê que quatro novos nomes deverão ser publicados para os géneros resultantes da divisão do anterior, sendo obrigatoriamente retido o nome do género dividido para um dos resultantes . O nome do género ora dividido é - por maioria de razão - retido por aquele que inclui a espécie que é o tipo nomenclatural do género. Assim, neste caso, Acacia Mill. seria o nome legítimo do género que inclui Acacia nilotica (*): o tipo nomenclatural de Acacia Mill antes da divisão. É uma espécie africana e do sub-continente indiano e de onde se extrai a goma arábica.

Expectavelmente, as espécies africanas (e uma europeia: Acacia radianna, de Gibraltar) continuariam a pertencer a este género, agora incluindo menos espécies do que antes, mas sem alteração nomenclatural. Outros nomes - seriam aplicáveis aos outros quatro novos géneros. Em particular, às acácias ou 'watlles' australianas aplicar-se-ia o nome genérico Racosperma Mart., proposto já por Karl Martius em 1835.

Acontece que um grupo de botânicos australianos quer sonegar o nome Acacia Mill. para a sua terra natal, para ser aplicado estritamente às acácias australianas. Para tal, socorreram-se habilidosamente de dois artigos do CINB que possibilitam a rejeição do tipo nomenclatural em vigor (A. nilotica) e eleição de um novo tipo (um neotipo) ... desta feita australiano. Tal possibilidade está prevista no Código, para quando o exemplar-tipo se perdeu, desapareceu, não é, ou é ambiguamente indicado sendo impossível de determinar com certeza de entre o material original do autor que descreve o táxone. (Ou ainda, como é o caso de Acacia Mill, ser escolhido a posteriori por outro autor consistentemente com a descrição e desejavelmente entre o material original do autor que publicou o nome - chama-se neste caso um lectotipo). Ou por fim, outra razão que o o CINB prevê para escolher um neotipo é se se considera que manter o antigo traduz alguma séria inadequação taxonómica- o que é obviamente subjectivo e sempre discutível. E os australianos fizeram-no: publicaram uma rejeição do lectotipo legítimo de Acacia Mill.: A. nilotica, que tinha sido designado pelos americanos N. L. Britton et A. Brown em 1913 e elegeram como neotipo uma acácia australiana - apropriando-se assim com o nome antigo Acacia apenas para si e para a Austrália e corrompendo em absoluto o conceito original do género Acacia. Isto é, relegando as acácias africanas para outros géneros. A proposta australiana, a ser seguida, implicará a transferência de género - e mudança de nome - de todas as acácias africanas. O motivo principal evocado para este golpe de bastidores pouco leal, foi o argumento de que a Austrália tem a maioria das espécies (são de facto muitas centenas). Imediatamente se levantou um coro de protestos internacional liderado pela África do Sul e a meu ver com toda a razão.

Prefigura-se actualmente uma votação no próximo Congresso Mundial de Botânica, motivada por este caso, para tentar emendar os artigos do código e liminarmente rejeitar esta neo-tipificação. O motivo principal é que tal precedente perfigura uma Caixa de Pandora nomenclatural, pois a partir de agora qualquer argumento servirá para rejeitar tipos e alterar quase a bel-prazer nomes cujo conceitos demoraram muito tempo a estabilizar e à custa de muito sangue suor e lágrimas de várias gerações de botânicos.

Claro é que o CINB em vigor deve ser sempre respeitado, mas sob pena de voltarmos ao caos nomenclatural pré-lineano. E como todas as leis, têm o seu espírito e a sua letra, esta leitura australiana é um claro abuso dificilmente tolerado. Em suma, a pretensão dos australianos até pode ser válida de acordo com o CINB, mas que é profundamente desleal, é.

Como nota de rodapé e prevendo um mais limitado coro de protestos desta vez em Portugal - entre os profissionais da floresta -pelo incómodo causado e porque resistimos sempre ás mudanças - espero mesmo assim, que caia em saco rôto a proposta australiana. Assim e como são todas australianas, passemos a chamar ás nossas terríveis acácias invasoras o nome de devem ter: Racosperma Mart. (Racosperma dealbata, R. melanoxylon, R. saligna, R. longifolia & etc.). Se fazem favor.

(*) Parece ainda que o nome correcto desta acacia até é Acacia scorpioides (L.) Wight. Mas é um sinónimo homotípico (tem o mesmo tipo) de A. nilotica, pelo que é, de facto , indiferente para a discussão do caso.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Sapal externo vrs. sapal interno

Se gosta de botânica, e de geobotânica (= ciência da vegetação), tem, quanto antes, de se iniciar na exploração dos nossos sapais. Aprender a distinguir as plantas halófilas e sub-halófilas, e perceber a forma como se organizam ao longo dos gradientes ecológicos prevalecentes no sapal é uma experiência indispensável Acredite, nem se dá pelo passar das horas.
Como começar?
Para entender os sapais é necessário, em primeiro lugar, identificar os dois gradientes fundamentais que controlam a organização da vegetação de sapal. O primeiro é um gradiente de salinidade, de montante para jusante; horizontal, portanto. O segundo, um gradiente vertical, microtopográfico, chamemos-lhe assim.
O primeiro gradiente é fácil de discernir nos sapais abastecidos por cursos de água doce. A jusante, na direcção do mar, onde o teor em sal do solo e da água é mais elevado, situa-se o sapal externo, dominado por gramíneas e por amarantáceas de caules carnudos e articulados. A montante, quando a influência da água do mar se rarefaz, encontra-se o sapal interno, geralmente colonizado por plantas não a moderadamente halófilas, muitas delas de fisionomia graminóide (i.e. com a forma de gramíneas) e de grande biomassa. Exemplos: Bolboschoenus (Scirpus) maritimus (Cyperaceae) «triângulo», Arundo donax (Poaceae) «cana», Phragmites australis (Poaceae) «caniço» e Typha latifolia (Typhaceae) «tabúa-larga».


Neste sapal alentejano observa-se em primeiro plano um sapal externo médio de Sarcocornia fruticosa orlado, lá trás, por uma comunidade de Arundo donax (Poaceae) «cana». Neste exemplo, a lavagem dos sais pelas águas de escorrência superficial e subsuperficial, concatenada com a acumulação de um pequeno coluvião, são suficientes para que se diferencie uma estreita faixa de solo adequada ao desenvolvimento de uma comunidade característica do sapal interno.

Bolboschoenus maritimus (Cyperaceae) «triângulo»

Bolboschoenus maritimus (Cyperaceae) «triângulo», pormenor da inflorescência


Phragmites australis (Poaceae) «caniço»

Typha latifolia (Typhaceae) «tabúa-larga»

Para saber mais sobre este tema haverá que ler a ficha Rede Natura 2000 dedicada aos estuários (clicar aqui).


Ficha Rede Natura 2000 dedicada aos estuários realizada pela ALFA-Associação Lusitana de Fitossociologia


O dito gradiente microtopográfico fica para o próximo post ;)
[fotos C. Aguiar]

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Salicornia ramosissima (Amaranthaceae)

Uma Salicornia, outro género halófilo (de plantas adaptadas a solos ricos em sais) frequente nos sapais externos nacionais:

Salicornia ramosissima (Amaranthaceae)
[Sapal da Baía do Monte de Saint-Michel, foto C.Aguiar]

As Salicornia são amarantáceas anuais de caules carnudos e articulados (atenção, as Sarcocornia e os Arthrocnemum são perenes). Trata-se de um género difícil ao que parece com uma única espécie, muito polimórfica, em Portugal: a S. ramosissima. Esta posição conservadora assumida pela Flora Iberica não é aceite por todos os autores.
Taxonomias à parte, as Salicornia são muito interessantes pela sua ecologia. Estas espécies habitam áreas perturbadas (e.g. pelo pisoteio e pela deposição de sedimentos) nos sapais externo baixo (e.g. comunidades Sarcocornia perennis subsp. perennis), externo médio (e.g. comunidades de S. perennis subsp. alpini, de S. fruticosa ou de Halimione portulacoides) e, por vezes, de prados-juncais e outras comunidades halófilas. Vamos ainda encontrá-las em salinas e nas margens dos canais que sulcam os sapais (os maiores e mais largos chamam-se esteiros) e estão submetidos, duas vezes por dia, à acção mecânica das marés.

Nos Verões mais secos e prolongados, nos sapais atlânticos (eurossiberianos), verifica-se uma subida assinalável do teor em sal nos solos que não contactam directamente com a água do mar (e.g. solos dos prados-juncais). Existem evidências que algumas das plantas que colonizam estes solos não conseguem tolerar a subida da pressão osmótica do solo (i.e. do teor em sais), morrem, penetrando as Salicornia em sua substituição. O inverso ocorre nos Verão húmidos. Que belo mecanismo de co-existência!

Nos sapais encontramos então uma vegetação anual - que os fitossociólogos colocam na classe Thero-Salicornietea - adaptada a preencher áreas perturbadas. Curioso, o mesmo acontece em algumas comunidades dunares (dunas secundária e terciária), e nos solos não compensados hidricamente em toda a região mediterrânica (excepto nas montanhas mais altas). Este tema merece ser aprofundado um dia destes.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Tipo nomenclatural de Hydrangea paniculata Sieb. (Hydrangeaceae)


Billhete postal novecentista do Parque Siebold em Nagasaqui, Japão (fonte: Wikipedia commons).



Tipo nomenclatural de Hydrangea paniculata Sieb. (Foto: J. Capelo, 2009)


É sempre uma ocasião especial ser-nos dado observar um tipo nomenclatural. Relembro que se trata de um exemplar de herbário ao qual está associado indelevelmente o nome científico de uma planta. Quaisquer que sejam as reviravoltas na classificação e nomenclatura - mudanças de género, fusões, divisões (de espécies), mudanças de categoria, combinações, substituição de nomes - o tipo está lá, sempre associado ao nome original (chama-se basiónimo, por isso) e vai viajando ao sabor das tentativas de estabilização nomenclatural e de obtenção de um modelo taxonómico coerente - ora entre parêntesis, ora fora, ora relegado para sinónimo. Não é o caso desta 'hortênsia', que - por enquanto - foi descrita e ficou como tal desde então.

Este fotografei-o numa exposição dedicada a Philipp Franz von Siebold (1796-1866), médico e naturalista alemão ao serviço do governo holandês que descreveu esta espécie de hortênsia- Hydrangea paniculata - e aliás, muita da flora e fauna do Japão: país onde viveu vários anos. (Descreveu a salamandra-gigante japonesa, por exemplo).

Está também ligado a certos exemplares de herbário, a história de quem os colheu. Por ter tido acesso a mapas cedidos pelo astrónomo-chefe do Império e cartografado uma parte do Norte do Japão, P. F. Siebold foi acusado de alta traição pelos japoneses. Ofereceu-se para nunca mais deixar o país e por honradez, assim nunca revelar os segredos de estado. Os japoneses apreciaram de tal modo o gesto, que ele e a sua colecção foram autorizados a deixar o Japão a bordo do famoso navio Batavia e regressar à Holanda.

Como de costume, está ligado aqui o artigo da wikipedia relativo à biografia deste botânico.

Veja aqui um site com variedades hortícolas de hortênsias 'paniculata'

sábado, 12 de setembro de 2009

Árvore filogenética das Angiospérmicas: últimas novidades

Não me canso de olhar para esta árvore, que nos é oferecida pelo Dr. P. F. Stevens (Missouri Botanical Garden) aqui:


O exercício é sempe o mesmo: precorrer a árvore e descobrir as diferenças em relação às versões anteriores (embora todas as alterações estejam relatadas no website).
Nos últimos meses as alterações foram significativas. As Caryophyllales - ordem que inclui os cactos, as pequenas Cariofiláceas e as plantas de sapal (Amaranthaceae) referidas nos últimos posts - já não estão na vizinhança da base das Eudicotiledóneas. Dados recentes indicam que a divergência deste grupo é posteiror à do grande clado das Rosidas. Alterações significativas ocorreram também em ramos mais recentes desta grande árvore, por exemplo, com a colocação dos Escalloniales lá para os lados dos Asterales, a ordem que inclui a grande família das Asteráceas. Quem não conhece a Escallonia rubra, um arbusto chileno resistente ao frio muitíssimo cultivado em Portugal em sebes de jardim, cujas conexões filogenéticas eram incertas há pouco tempo atrás?

Escallonia rubra (Escalloniaceae) [foto C. Aguiar]

Ler árvores filogenéticas tem os seus truques. Uma óptima introdução pode ser importada daqui, a conselho de P. F. Stevens.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Apiáceas litorais: Daucus carota subsp. halophilus

Um endemismo da Costa Vicentina e do Barlavento Algarvio, o Daucus carota subsp. halophilus:


Esta apiácia pode ser localizada, sem grande esforço, nas escarpas litorais, geralmente em ressaltos húmidos e protegidos do sol.
A subsp. halophilus é bem distinta das restantes (quatro) subespécies de Daucus carota presentes em Portugal continental. Não sei que chegue de Daucus para ter uma opinião informada, mas o estatuto de espécie fazia sentido nesta planta.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Sarcocornia perennis vrs. S. fruticosa (Amaranthaceae)

Continuando pelo litoral ...
Num post recente (aqui) apresentei dois géneros fundamentais na estrutura da vegetação de sapal: Sarcocornia e Arthrocnemum. Pertencem ambos à família Amaranthaceae (inc. Chenopodiaceae) e mostram uma morfologia semelhante: plantas perenes de caules carnudos e articulados. O Arthrocnemum macrostachyum, a única espécie do género em Portugal, habita sapais mediterrânicos não sendo por isso conhecido dos sapais a norte do Rio Mondego. A Sarcocornia fruticosa sobe um pouco mais a norte, até ao sistema lagunar do Vouga. A S. perennis é frequente em todos os sapais nacionais.

Antes de explorar a estrutura da vegetação dos sapais, tema que abordarei um destes dias, é necessário distinguir bem Sarcocornia perennis de S. fruticosa, e as duas subespécies de S. perennis.

O arbusto prostrado em primeiro plano é a Sarcocornia perennis subsp. perennis; em segundo plano, à esquerda, temos a Sarcocornia fruticosa, e, à direita, outra importante planta de sapal, o Halimione portulacoides. As plantas da foto estão cobertas de uma fina película de limo porque são visitadas pelas marés duas vezes por dia .


Pormenor de Halimione portulacoides (Amaranthaceae). Nos sapais eurossiberianos, a Norte de Aveiro, são frequentes comunidades quase extremes desta espécie.

A Sarcocornia perennis distingue-se facilmente da S. fruticosa pelos seus artículos caulinares em forma de barril e por enraizar nos nós (necessariamente do caule porque só os caules têm nós), como se constata na figura seguinte:

Pormenor de Sarcocornia perennis subsp. perennis (Amaranthaceae). N.b. raizes adventícias inseridas nos nós de caules submergidos na vasa (plantas arrancadas para o efeito).

As subespécies portuguesas de S. perennis são muito semelhantes. A S. perennis subsp. perennis é um pequeno arbusto sufruticoso (= sufrútice) rasteiro de caules flexuosos (até 20 cm de altura); a S. perennis subsp. alpini tem caules mais rígidos e ergue-se a maior altura (até 60-80 cm de altura).
[fotos C. Aguiar]

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Plantago maritima (Plantaginaceae)

Temos um outro Plantago litoral nas plataformas rochosas sobraceiras ao mar e nos sapais do NW: o Plantago maritima. Conforme se pode confirmar na foto a morfologia das folhas é suficiente para separar o P. maritima das formas litorais de P. coronopus.

Plantago maritima (Plantaginaceae). Espécie distribuida pelas costas atlânticas da Europa e da América do Norte, atingindo, com populações mais dispersas as costas mediterrânicas ocidentais [Foto Esposende, Fão; C. Aguiar].

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Comunidades de paredes ressumantes do SW Alentejano

Nas escarpas litorais com águas ressumantes organiza-se umas das comunidades de plantas mais notávies do SW Alentejano. Recentemente, um grupos de fitossociólogos, encabeçados pelo Prof. Carlos Neto da Fac. Letras da Univ. Cl. de Lisboa, descreveu esta comunidade sob o nome Didymodon spadicei-Adiantetum capilli-veneris (classe Adiantetea).



O Didymodon-Adiantetum capilli-veneris é dominado pelo feto Adiantum capillus-veneris «avenca». Acompanha este feto um leque variado de espécies onde se destacam, entre outras, o Samolus valerandi e o Isolepis setacea(= Scirpus setaceus).


Samolus valerandi (Theophrastaceae). Planta recentemente transferida para a família Theophrastaceae, comum nos solos temporariamente encharcados do litoral centro e sul.
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Isolepis setacea (Cyperaceae). Uma das plantas mais frequentes nas comunidades de solos temporariamente encharcados um pouco por todo o Portugal Continental

Nas comunidades de escarpas ressumantes litorais do SW Alentejano é comum um Plantago coronopus perene, de folhas crassas (gordas) dentadas no ápice que o Prof. João do Amaral Franco designou por P. coronopus subsp. occidentalis. Este táxone é dificilmente sustentável porque são frequentes morfologias intermédias entre ele e as formas continentais de P. coronopus. Vi plantas semelhantes a estas nas arribas litorais da Ilha de S. Miguel.

Ecótipo litoral de Plantago coronopus (Plantaginaceae).
[Fotos C. Aguiar]

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Apiáceas litorais: Distichoselinum tenuifolium e Cachrys libanotis

Raramente tenho oportunidade de explorar a flora e a vegetação litorais na Primavera porque vivo a 200 km do mar. Chegam o Verão, as férias e a praia ... e a maior parte das plantas do litoral já floriu e frutificou. Não vejo Armeria, Thymus, Stauracanthus ou Linaria anuais em flor. Em contrapartida, colho e fotografo bons "cadáveres" de apiáceas. Sobra-me esta consolação porque para identificar apiáceas (= umbelíferas) são necessários frutos maduros de preferência colhidos em indivíduos senescentes (a grande maioria das umbelíferas portuguesas é anual ou se perene renova anualmente a parte aérea na Primavera).

Aqui vão duas curiosas e infrequentes umbelíferas litorais:



Distichoselinum tenuifolium. O género Distichoselinum é endémico da Península Ibérica e monoespecífico (detem uma única espécie). O D. tenuifolium distribui-se desde a Comunidade Valenciana (Espanha) até ao Algarve. Fotografei esta planta nas arribas sobranceiras à praia do Burgau (Algarve).



Cachrys libanotis. Esta espécie dunar tem uma área de distribuição mais lata (W da Região Mediterrânica) embora em Portugal se restrinja ao Algarve e à costa do SW. Sem grande esforço podem-na encontrar nas dunas secundárias de algumas das praias mais famosas da Costa Vicentina.